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  • Gabriel Mafra

Livros artesanais resistem às novas tecnologias

Em Curitiba, editora se transformou em referência na produção editorial artesanal

Além de sócio da Arte & Letra, Frede, como é conhecido, também é responsável pelo design gráfico dos livros. (Crédito: Marcia Boroski)

Em um mundo digitalizado, tecnologias modernas surgiram como opções para substituir o convencional livro impresso. E-books, podcasts e audiobooks são exemplos. Apesar de tudo isso, existe quem não siga essa tendência.É o caso de Frederico Tissot, ou Frede, designer e sócio da Arte & Letra, editora de Curitiba que produz livros artesanais. A editora funciona juntamente com um café, além de uma gráfica.

No começo, trabalhavam com impressões tradicionais, e adotaram o método artesanal somente em 2013. “Começamos como editora no começo dos anos 2000, era só um escritório. Abrimos uma pequena livraria em 2006 dentro de um café da cidade. Em 2011 fomos para um espaço que montamos a livraria e o café juntos, e estamos nesse endereço a 3 anos" explica Tissot.

Inicialmente a proposta era produzir com tipos móveis, Frederico chegou a adquirir um família de tipos, mas desistiu depois de um tempo; seria inviável inserir a linotipia, que é um processo mais complexo, na proposta da editora. "A proposta da editora é trabalhar com literatura. Então trabalhamos principalmente o texto, e os de literatura são muito grandes para trabalhar com tipos móveis" lamenta.

Para produzir com os linotipos era necessário terceirizar a produção. A editora trabalhava o texto, fazia as matrizes , a diagramação, e mandava para uma empresa na cidade de São Paulo. Lá, o livro era impresso e enviado novamente para correção da editora, depois, devolvido para serem feitos os devidos ajustes. Então todo o processo de escolha do material, edição de texto, imagens, impressão e revisão demorava quase um ano para ser concluído.

Os tipos móveis foram o primeiro material utilizado na produção artesanal na Arte & LetraEles são colocados em uma máquina que derrete o chumbo para transferir as letras para o papel. (Crédito: Gabriel Mafra)

Mesmo assim, a primeira experiência foi totalmente artesanal. Foram feitas duas coleções com três títulos cada, produzidos com linotipia e xilogravura "Fizemos 250 na primeira experiência, todos são autenticados e numerados. A encadernação foi feito a feita a mão, tudo foi colado e costurado a mão. Totalmente manual mesmo" relata.

Tissot explica o porquê da desistência de trabalhar com os linotipos "Depois dessa experiência, houve uma crise de mercado, e como terceirizávamos nossa produção era difícil, porque precisávamos ficar esperando para saber se era possível ou não a produção com linotipos. E acabou ficando inviável, porque você fica fora do mercado. Se produz muito pouco a um custo muito alto." relembra. Além disso, não houve uma renovação na área. As poucas gráficas que possuem o maquinário são muito antigas e estão acabando.

Foi neste cenário que a editora começou a pesquisar formas de fazer toda a produção artesanal e chegou até a lisografia, processo que utilizam desde o final de 2017. Para isso, foi estruturada uma pequena gráfica dentro das instalações da Arte & Letra "Começamos a trabalhar com impressão em lisografia, e fazemos a encadernação manual. Não é um processo totalmente artesanal, como os linotipos, porque utilizamos um equipamento eletrônico na produção. Mas esse formato tem algumas especificidades que tem haver com a ideia artesanal. A impressão nunca sai igual, por exemplo." explica. Os livros são produzidos em lotes de 300 exemplares cada e são repostos conforme a demanda das vendas.

A produção ainda é manual, mas com o processo de lisogravura. (Crédito: Gabriel Mafra)

Referência local

Além da literatura, a Arte & Letra trabalha com livros de ficção, cinema e traduções. Também realiza um trabalho importante de valorização dos escritores locais. "Temos um trabalho bem forte local, trabalhamos com escritores daqui. Acabamos nos tornando uma referência. Curitiba tem uma tradição forte de escritores, mas não de editoras de literatura. Nesse tema (literatura), somos nós que fazemos mesmo. Até existe uma ou outra, mas com trabalho menor. Mas para colocar os livros no mercado é basicamente a gente." salienta Frede.

O fato de da livraria funcionar junto com o Café corrobora para isto. O espaço se tornou um ponto de encontro para escritores de Curitiba. Nesses encontros surgem ideias para novos livros que podem ser publicados. Além disso, novos escritores chegam até a editora buscando uma oportunidade para publicar seus trabalhos. As obras passam por um conselho editorial antes de serem publicadas

O fato de ter o Café colabora para isto. "Como temos livraria e o café o espaço acabou virando uma referência. Os escritores se encontram aqui, daí acabam surgindo idéias. Muita gente já nos procura falando 'olha escrevi esse livro, queria publicar.' E dai vamos selecionando.".

O usto para publicar todas as obras é muito alto, então, para atender a demanda dos novos escritores foi criado o selo Cajarana, exclusivo para novos autores. Neste selo, o escritor paga uma parte dos custos de produção para poder viabilizar o projeto e ajudar a colocar os livros no mercado. Para os autores, é uma boa oportunidade, já que as obras da Arte & Letra estão disponíveis nas maiores livrarias do país, além da loja física e do site da editora.

A Arte & Letra se tornou um ponto de encontro para escritores no bairro batel, em Cuiritiba (Crédito: Gabriel Mafra)

Xilogravura

Uma das técnicas usadas nas produções de livros artesanais é a xilogravura. É importante lembrar que existe diferença entre os termos xilogravura e xilografia. O termo xilogravura é a união da tradução em grego de xilón (madeira) com grafien (escrever através de), é a gravura feita sobre a madeira. E Xilografia é a essência do termo na utilização de outros suportes, como o “linóleo” , e a “papelogravura” , por exemplo. Utiliza-se da superfície em relevo para distinguir onde irá entintar.

Nelson hohmann é formado em Artes Plásticas pela Faculdade de Artes do Paraná (FAP), e ministra aulas de xilogravura no Solar do Barão, em Curitiba, ele explica que as prováveis origens da xilogravura remetem à cultura oriental. “Segundo historiadores, a xilogravura foi criada pelos chineses e já era praticada por este povo desde o século 6. Durante a Idade Média, a xilogravura firma-se no ocidente, ganhando inovações durante o século 18. Com sua difusão por diversos países, acabou chegando às nações europeias, onde influenciaram as artes do século XIX."

Enquanto todos copiavam a técnica chinesa, o ourives alemão Johannes Gutenberg inventou a prensa de tipos móveis, um método de impressão que transformou a cultura ocidental para sempre. A grande ideia de Gutenberg foi criar uma prensa capaz de tornar mecânica a transferência de tinta dos tipos móveis para o papel. Pela primeira vez na história os livros podiam ser produzidos em massa. Foi o início da democratização do conhecimento.

O primeiro livro produzido pela prensa de Gutenberg foi a Bíblia. Com a Prensa, foi possível combinar textos impressos e as ilustrações feitas em xilogravura, tornando o processo mais simples e barato. Não demorou muito para a prensa de Gutenberg se tornar popular e em 1.500 já existiam vinte milhões de livros publicados. A operação de imprimir documentos virou sinônimo de indústria e a imprensa foi criada. A xilogravura só começou a perder espaço com o surgimento da cacografia (impressão em metal), que permitia a obtenção de traços mais delicados através de linhas menos espessas.

Imagens produzidas em xilogravura, utilizadas na Arte & Letra. (Crédito: Gabriel Mafra)

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