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  • Nicole Bek

Liberação de agrotóxicos coloca em cheque a qualidade dos alimentos

Só em 2019 o governo liberou 290 novos pesticida; em contrapartida, cultivo urbano de hortaliças tem sido cada vez mais realizado

A Abrasco realizou uma pesquisa e concluiu que 64% dos alimentos no Brasil são contaminados por agrotóxicos. (Crédito: Nicole Bek)

Nos últimos meses, o uso de agrotóxicos vem sendo pauta de discussões no país. Desde o início do ano, o Ministério da Agricultura atingiu recorde de liberação de diversos novos agrotóxicos para o uso no agronegócio brasileiro. Muitos deles, não permitidos na Europa e EUA. Nesse cenário, uma série de organizações e associações tem buscado saber qual a quantidade e os tipos desses produtos utilizados no país. Segundo a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), em pesquisa realizada em conjunto com o Ministério da Saúde, 64% dos alimentos no Brasil são contaminados por agrotóxicos.

Outro dado que chama a atenção vem da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), umas das principais referências no assunto. A FAO pesquisou a quantidade investida em pesticidas nos vinte maiores países (no quesito desenvolvimento econômico) em 2013. Os resultados foram apresentados em três categorias. Com relação aos gastos, o Brasil ficou em 1º lugar no ranking, com US$10 bilhões. Nas categorias de consumo por área cultivada e consumo por produção agrícola, o Brasil cai, ficando em 7º lugar na primeira e em 13º na segunda.

Até o fechamento dessa reportagem, haviam sido liberados 290 agrotóxicos só em 2019, segundo dados do Diário Oficial da União. Os dados são sistematizados e veiculados pelo bot @orobotox, um projeto da Agência Pública e do Repórter Brasil. O androide faz um levantamento diariamente no Diário e divulga os novos agrotóxicos liberados e o grau de toxidade, e outros dados importantes, sobre cada um deles.

Perfil do Robotox no Twitter. (Crédito: Reprodução)

Os agrotóxicos são substâncias químicas que alteram a composição da água e da planta para impedir a proliferação de espécies de insetos e de doenças que prejudicam o bem-estar e a produtividade da agricultura. Mas esses benefícios não superam as consequências que esses produtos acarretam na saúde de quem tem contato direto, agricultores e trabalhadores das indústrias de agrotóxicos, ou indireto, consumidores dos alimentos.

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), as principais doenças relacionadas à intoxicação por agrotóxicos são: doença de Parkinson, arritmias cardíacas, fibrose pulmonar, lesões renais, câncer, alergias respiratórias, entre outras ainda desconhecidas, já que o agroquímico pode sofrer mutações e as consequências ainda não são totalmente conhecidas pela comunidade científica.

Cultivo livre de agrotóxico

Pensando nesse excesso de agroquímicos, muitas pessoas vêm investindo em espaços naturais onde possam plantar seu próprio alimento livre de agrotóxicos. A influência tem sido tão produtiva que já se tornou uma opção de negócio para muitos empreendedores, que viram no estilo de vida sustentável uma forma de oferecer à população opções melhores de alimentação saudável.

É o caso do empresário Valdemir Krauze que tem como diferencial, em seu hostel (localizado no centro de Curitiba, em frente à Praça Santos Andrade), a oferta de saladas orgânicas, plantadas ali mesmo. Ele segue o processo do plantio hidropônico que consiste em um sistema de cultivo de plantas caracterizado por não precisar de solo: as raízes das plantas ficam dentro da água. Há também a semi-hidroponia, que, segundo Krauze “consiste em adaptar sacos de plantação de morango, que custam em média R$20,00 cada, e uma bomba para facilitar a irrigação para o plantio. No caso da plantação caseira, pode ser feita com regador”. Outra iniciativa que incentiva o cultivo do próprio alimento é a Minhorta, uma Startup curitibana, que se fundamenta na venda de kits mensais com tudo que se utiliza para plantar hortaliças, o que facilita o plantio e economiza tempo.

Além destas ações privadas, a SMSAN (Secretaria Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional), criou, em 1986, um projeto para combater a barreira de acesso das famílias mais desfavorecidas ao alimento e, também, estimular a ocupação de espaços vazios na cidade. A proposta consiste no cultivo de hortaliças e pequenas lavouras, além de gerar renda extra às famílias com a venda dos excedentes

Em 2018, a Câmara dos Vereadores de Curitiba aprovou a Lei da Agricultura Urbana (Lei nº 15.300/2018), que assegura o direito ao uso de espaços públicos e privados para o plantio. Atualmente, são 71 hortas alinhadas às políticas públicas do município, divididas em institucionais, escolares e comunitária. Qualquer cidadão pode participar dessas ações, desde que atue em conjunto com a associação de bairro ou sociedade civil organizada, tenha um terreno para fazer o plantio e vincule-se ao Núcleo Regional da Secretaria. Acesse aqui a tabela completa com informações das hortas urbanas.

Atividade que transforma

Regina Aparecida Ramos Alexandre é aposentada e tem 60 anos. Desde os 48 anos, quando ainda trabalhava como doméstica, faz parte da horta comunitária, localizada no Ganchinho. Ela conta que entrou no projeto com a visão de plantar para ela e para a família e ter uma alimentação mais saudável, além da possibilidade de poder vender o excedente.

Doze anos depois ela diz que a atividade lhe deixa mais feliz e que se tornou uma ocupação diária, dedicando em média seis horas de seu dia. "Além de fazer bem à alma, traz uma renda extra”, conta.

Hoje, Regina tira em torno de R$300,00 mensais com o cultivo de hortaliças. A aposentada vende apenas aquilo que ela colhe e que não é consumido na sua casa. Seu marido, Paulo Alexandre, 64 anos, conta que também percebeu benefícios na atividade que a esposa exerce e se juntou a ela.

Além de trazer benefícios para a saúde e renda, a agricultura urbana vem mostrando outros vieses, mais terapêuticos. É o que sentiu Armando Cândido Pinto, de 52 anos, é autônomo e também é um dos trabalhadores da horta comunitária do Ganchinho. Ele procurou o projeto depois de um trágico episódio de sua vida, no qual seu filho faleceu. Desempregado e num quadro depressivo, o autônomo conta que o ofício veio como uma forma de ocupação da cabeça. "Foi um jeito que encontrei para me sentir útil e driblar o desemprego", explica.

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